quinta-feira, 24 de julho de 2014

Nem tudo tem uma sigla


Agora que dei um recado a uma amigo, não tenho mais o que dizer. Mentira, tenho sim, só que ainda não sei o que é, e a forma de extrair as ideias, não, não são ideias, seriam, sei lá, pensamentos, sensações, percepções, tudo menos algo que se saiba nomear, enfim, a forma de extrair essas coisas que se diz num texto, ela ainda não é um processo documentado, como uma receita de bolo ou um manual de operação do seu amigão de plástico. Não. É algo como voar, existe todo um jeitinho para isso. Tu pega o papel em branco, ou a tela, ou o quadro negro, enfim, o que raios tu for usar pra escrever, tu encara aquele troço ali, sem coisa alguma, e não olha nele, tu não pensa nele, tu só faz com que ele deixe de estar em branco e, quando vê, tá ali, alguma coisa escrita, sabe-se lá o que queira dizer, na verdade tudo que a gente queria dizer era algo que explicasse o que a gente não consegue dizer, que vem a ser muita coisa, a imensa maioria, e como bom mesmo é ser minoria, a gente finge que sabe do que tá falando num charlatanismo mútuo: eu finjo que demonstro, tu finge que percebe. Conoto, discorro. De tudo um pouco; tudo menos algo que saiba se explicar. Quem faz o manual de instruções da máquina de lavar roupa, de lavar prego, qualquer máquina, que eu saiba não é ela mesma. E quem é esse cara que diz como se deve usar alguma coisa, se ele nem sabe usar a cabeça, a mão ou a orelha pra dizer o que ele pensa, que não vem nem a ser pensamento, porque o que ele pensa ele até entende, agora essa coisa que sai quando o cara resolve se expressar, o que é isso?, expressão?, isso eu não sei, nem ele, mas ele escreveu um manual, pelo menos não se atreveu a falar de si, e eu, de que ouso falar aqui, ah, Joe, é só sobre o tempo, que tá uma chuvinha boa demais, adoro essa época, o tempo passa e a chuva também, mas explicação, essa não vem, e nem precisa. Eu devia ter anotado o telefone do doutor.

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