Que coisa bonita é um velório!
Primeiro
te besuntam, te arrumam, te enchem de flores e te colocam numa caixa feita
sobre medida pra ti, às vezes até acolchoado da mais pura seda. Logo depois te
levam para um lugar aconchegante onde tu és a atração principal - pelo menos
uma vez na “vida” tu és o centro das atenções.
Nesse
lugar especial tu vai estar rodeado daquelas pessoas maravilhosas que mal
lembram o teu nome, uma vez que não te veem há mais de vinte anos porque
estavam preocupadas demais com suas próprias vidas. Nesse local de reencontro,
enquanto tu apodreces o pessoal bota o papo em dia – não poderiam ter feito
isso em um domingo qualquer de sol, é claro - olhando pra teu corpo pálido,
dizendo que a vida é muito curta e que deveriam ter aproveitado mais os
momentos contigo e que vão valorizar mais cada momento em companhia dos amigos
e parentes, já que não somos nada frente à face da morte.
O
tempo vai passando e o assunto não para; aquelas tias velhas sentadas em volta
do caixão, com suas caras de bunda de sofrimento e complacência acham que fazem
uma diferença enorme no meio do sofrimento verdadeiro de poucos ali. Irônico é
pensar que o que mais fede ali não é o cadáver, mas sim a hipocrisia dos seus
“pêsames sinceros”, cheios de “carinho” e “dor”. Enquanto uma vela arde na
frente de uma tela de Jesus Cristo, chegam ainda mais daquelas belas coroas
enormes cheias de flores e mensagens de apoio, deixando o ambiente cada vez
mais atraente.
Depois
de um tempo chega um chazinho, um bolinho, aquele que era o teu preferido, e o
papo não para. Ainda têm aquelas pessoas realmente importantes, não são aquelas
que fizeram parte da tua vida e estavam contigo quando tu precisaste, mas
aquelas que passam a madrugada no velório; Nossa! Esses realmente são
importantes, porque deixaram de ir dormir nas suas camas quentes pra passar a
noite junto do teu belo cadáver inchado. Que recompensador!
Mas
ainda não terminou, tem aquele momento da “última olhada” antes de fecharem o
caixão, nesse momento fazem fila, nesse momento tu és a estrela principal. A
maioria tem que fazer isso porque não tem nem mesmo uma foto contigo. Tudo tem
que ser cronometrado é claro porque já está chegando outro defunto. Dão-te o
último adeus; sim, a última imagem que vão ter de ti é inchado, pálido, podre e
cheio de algodão no nariz. Fecham teu caixão!
Que
coisa bonita é um velório!
Arthur Manara
Dedico esse texto ao forte
ranço do meu amigo Maurício Ws.