quarta-feira, 14 de junho de 2017

Que coisa bonita é um velório!

      Que coisa bonita é um velório!
Primeiro te besuntam, te arrumam, te enchem de flores e te colocam numa caixa feita sobre medida pra ti, às vezes até acolchoado da mais pura seda. Logo depois te levam para um lugar aconchegante onde tu és a atração principal - pelo menos uma vez na “vida” tu és o centro das atenções.
Nesse lugar especial tu vai estar rodeado daquelas pessoas maravilhosas que mal lembram o teu nome, uma vez que não te veem há mais de vinte anos porque estavam preocupadas demais com suas próprias vidas. Nesse local de reencontro, enquanto tu apodreces o pessoal bota o papo em dia – não poderiam ter feito isso em um domingo qualquer de sol, é claro - olhando pra teu corpo pálido, dizendo que a vida é muito curta e que deveriam ter aproveitado mais os momentos contigo e que vão valorizar mais cada momento em companhia dos amigos e parentes, já que não somos nada frente à face da morte.
O tempo vai passando e o assunto não para; aquelas tias velhas sentadas em volta do caixão, com suas caras de bunda de sofrimento e complacência acham que fazem uma diferença enorme no meio do sofrimento verdadeiro de poucos ali. Irônico é pensar que o que mais fede ali não é o cadáver, mas sim a hipocrisia dos seus “pêsames sinceros”, cheios de “carinho” e “dor”. Enquanto uma vela arde na frente de uma tela de Jesus Cristo, chegam ainda mais daquelas belas coroas enormes cheias de flores e mensagens de apoio, deixando o ambiente cada vez mais atraente.
Depois de um tempo chega um chazinho, um bolinho, aquele que era o teu preferido, e o papo não para. Ainda têm aquelas pessoas realmente importantes, não são aquelas que fizeram parte da tua vida e estavam contigo quando tu precisaste, mas aquelas que passam a madrugada no velório; Nossa! Esses realmente são importantes, porque deixaram de ir dormir nas suas camas quentes pra passar a noite junto do teu belo cadáver inchado. Que recompensador!
Mas ainda não terminou, tem aquele momento da “última olhada” antes de fecharem o caixão, nesse momento fazem fila, nesse momento tu és a estrela principal. A maioria tem que fazer isso porque não tem nem mesmo uma foto contigo. Tudo tem que ser cronometrado é claro porque já está chegando outro defunto. Dão-te o último adeus; sim, a última imagem que vão ter de ti é inchado, pálido, podre e cheio de algodão no nariz. Fecham teu caixão!
Que coisa bonita é um velório!

                                                                                          Arthur Manara


                  Dedico esse texto ao forte ranço do meu amigo Maurício Ws.