quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Laboríntico

O longo corredor desabrochou em labirinto. Poderíamos andar devagar, por que correr? Parar aqui e comer uma pêra, olhar um quadro naquela quina, querer um sorvete, escolher o caminho do meio na próxima bifurcação; Pode até dar mais trabalho, mas também dá mais gosto.
Caminhar de mão dada e dando belisques no dedinho alheio; seguir pela saída e encontrar uma sombra bem boa, construir um abrigo, enroscar as pernas, estica-las, fechar os olhos por um instante sentindo o conforto que nenhum sofá proporciona, a suave sensação de ter encontrado um lugar no mundo, um paraíso entre um par de braços.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Sacro

Seria um homem santo, se soubesse ser assim.
Não incomode aquele sujeito.
Ele poderia ser tanta coisa, uma pessoa sagrada.
Poderia caber em uma palavra,
mas uma longa conversa não bastaria.
Àquele homem nada basta.
Não o chame de santo em sua frente,
apenas sorria e saia de seu caminho.
Lutaria, se houvesse razão.
Imaginaria algo que pudesse parar a carreira lomba abaixo que arrasta a nossa santidade à insanidade.
Fala com boca seca, palavras secas, nenhuma água veio dos céus.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

De onde vem?
Essa voz maravilhosa, quem és?
De preto e de branco, de sorrisos e encantos, que dentes!
Melhor seria nem saber ou não poder saber?
A verdade é que hoje está logo ali. Exposto e escondido num mar aberto, como uma ilha ou um caminho pisado.
Já sei o nome, o que faz, a data de nascimento, até algumas preferências sei eu.
Já é possível apontar o dedo e dizer.
É mais difícil mas ainda se tem a escolha do não saber. A magia do não saber. A pretensão do imaginar.
Daria pra ficar horas pensando. Não mais.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Notícias lemos, mundos criamos

Tá. Mas e se fosse diferente?
A unanimidade da comemoração do baleado. O credo, depositado nas histórias inventadas.
Eu falei pouco. Falei menos do que ouvi, e vi mais do que olhei.
O que seria diferente? Se até ti chegassem as cores, a alegria e somente?
Se das barbaridades que conhecemos todas, pensamos que miserável são as nossas vidas.
Mesmo a miserabilidade precisa de um sustento, como um cão precisa de um lar.
E se não prestássemos atenção? Como aqueles que estão inventando a miséria. Como a constância e a insistência no engano. Como o ódio de selo oficial, estampado.
Como seria o seu mundo então?

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

O dia que Chico chorou

Chico é um cara normal.
Poderia ser eu ou você. Chico trabalha, e só trabalha. Chico já estudou mas não quis virar doutor.
Chico, o que você fez? Magoou alguém. Não fez o bem.
Chico! Lhe apontavam os dedos. E os dedos... os dedos falam.
Mais do que falam, gritam. Xingam.
Então Chico é muito xingado. É.
Chico já tentou escrever muitas vezes em vão; Começou, continuou e parou.
Tentou falar. Tentou consertar, mas não haveria conserto. Nem mesmo concerto.
Uma orquestra talvez. Uma junção de todos os gritos apontando seus erros. Um coro que dá nascimento. Um coro que faz Chico nascer novamente, diferente, com outra cara. Um cara do comercial.
Um dia Chico ouviu um muito obrigado. Na sala de espera. Do Doutor Ricardo. E, ressabiado, colocou empenho em sua investigação. O erro não estava ali. E sim um acerto.
Logo depois Chico foi informado. Um câncer. Estava tomado.
E isso era tudo. Era muito.
E nesse dia apenas, Chico chorou.

Cinco dez quinze

Um abraço. Um amasso.
Uma dor depois do calor. O frio da lembrança de como era a felicidade. O abrigo danificado.
A busca. A luz e o esplendor que no futuro serão referidas como coisas que duraram.
E cinco anos se passaram.

A irresponsabilidade. A diversão. A vida eterna fora do vale de lágrimas.
Um abraço bem dado. De hiperatividade, um bocado. "E eles quase se amaram."
E dez anos se passaram.

As marcas da alegria intensa. O adeus da infância. O início da astuta elegância.
A promessa e a mentira. O arauto das regras.
Os heróis. O bem e o mal. Tudo o que é agora e tudo o que já se foi.
Lembranças que marcaram.
E quinze anos se passaram.

E a pergunta que não cala. A pergunta que brota a angústia, o pavor humano e o tempo que passa voando.
Até quando?