sábado, 27 de março de 2010

Gotas

Um dia, as nuvens se cansarão. Elas ficarão cansadas de ajudar as gentes tolas aqui embaixo. Ficarão cansadas de ver o desperdício que os daqui fazem com a benção dada por elas, fazendo mau uso daquilo que ganham, como que desprezando o presente de um amigo.
Pois deve realmente cansar, ver essas gentes se afogando, não nos rios que ajudamos a formar, mas nos poços de erros deles próprios. Não é surpreendente, pois é irônico ver pessoas jogando tanta água – tanto a mais do que seria preciso – na sujeira que elas mesmas fizeram.
Foi um equívoco pensar que recursos abundantes poderiam ser considerados infinitos. Ou, pelo menos, foi assim que se agiu, sem preocupação; sem a preocupação que agora sobra, mas que, infelizmente, existe apenas em alguns.
E essa despreocupação fez com que os despreocupados fossem, por si mesmos, a um ponto perigoso de um caminho desconhecido, chamado futuro. Talvez seja melhor parar e pensar um pouco, agora. Pensar no quanto pode ser seco daqui em diante. Parar e pensar, antes de continuar seguindo sem saber pra onde. Neste ponto perigoso, nos encontramos agora, a um passo de um precipício; à beira de um buraco que poderia ser um lago, se não tivéssemos jogado fora tanta água, por tanto tempo.

domingo, 7 de março de 2010

Estranhos

Chove. Debaixo de um grosso teto, abri o chuveiro e tomei um banho.
Fui de carro até o trabalho. Depois da volta, corri alguns quilômetros na esteira.
Na sala, fechei a janela e liguei o ventilador.
Paguei um garoto para trazer as compras até minha casa e ajeitar as mais pesadas na prateleira. Depois que ele partiu, fui fazer musculação na academia.
Antes disso, tinha ido ao barbeiro pagar pelo corte de cabelo do dia anterior. Coloquei uma touca antes de sair, pois aqui sempre venta e faz frio a noite.
Trabalhei até tarde, as contas estão altas. A babá dos meus filhos cobra muito, então deixo de ficar com eles para poder pagá-la...
Coisas comuns, nada demais.
Atos normais, claro.
E depois, o ornitorrinco é estranho, por ser mamífero e colocar ovos... e nós, que usamos tênis com amortecedores para pisar em calçadas mais duras que a terra, que nos banhamos em águas transmitidas por canos velhos e tomamos remédios contra nossos próprios micróbios, nós que corremos para poder descansar? O que somos nós?

Perdidos

Todos estamos. Todos perdidos.
Entre o que fomos e o que não fomos, entre o que os outros são e, principalmente, perdidos no ser igual a eles. Todos perdidos, em um lugar estranho que chamamos de casa, viajando em uma nave sem piloto.
E se soubéssemos pra onde vamos, ainda estaríamos aqui parados?

sábado, 6 de março de 2010

Saída

Pela primeira vez, eu acreditei em 2012.
Como uma pedra.
Tudo está ficando muito rápido e somos atropelados, encurralados e futuros escravos. E as pessoas dominam outras, dominam mundos. A humanidade é um doido correndo, fugindo de sua própria sombra. Mas há uma pedra no meio desse caminho. Esse doido vai tropeçar e, ao cair, será despertado de sua loucura pela dor.
2012 parece ser a cura prometida para um mal auto infligido. Talvez esse doido, que agora corre, tenha colocado essa pedra lá justamente para isso, quando ainda era são ou sábio. Preparou sua profecia, pois não havia outro jeito e logo não poderia confiar em si.