sexta-feira, 1 de junho de 2012

Quase Sempre

Pensar em como o dia foi cansativo, tirando os sapatos de salto alto, era algo comum. Planejar e repensar um futuro incerto, também.
Um "boa noite" para o avô, antes de entrar no quarto; a saudade daquele olhar grisalho era sempre grandona.
O ranger da porta incomodava ninguém, mas sempre a abria com cuidado, pois o mundo dos vivos é cheio de dúvidas, aprendera há pouco. Dois passos levinhos pra dentro do banheiro; tirar o batom, o rímel; lavar as mãos, sentir a maciez da toalha acariciando o rosto.
E nessa hora, quando botava a toalha de volta em seu lugar, após desfazer o disfarce que vestia lá fora, a inquietude eterna lhe levava do quarto de volta à sala.
Com os pés voltados para dentro, contemplava o retrato do avô, pendurado na parede, admirada com a expressão que o artista conseguira capturar; desconfiada de que, aquele olhar imortalmente inconsolável, somente quem conhece a própria angústia é capaz de expressar. Os garranchos da assinatura indicavam que aquele devia ser um auto retrato; não podia ser outro nome escrito ali, além de "Adolfo". Disso Sofia tinha certeza.

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