segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Ka-tet

Feito de plurais, chegou lá dia desses, dia qualquer, segunda de sol se bem me lembro, mas minha memória me falha tanto.
O cabelo comprido não lhe caía muito bem, fazia-o parecer uma samambaia ambulante, arrancava risos dos demais, que diziam que ele de alguma forma lembrava um pouco um sapo.
A princípio subestimei sua inteligência e conhecimento, talvez um método subconsciente de punição pela forma arrogante com a qual por vezes falava com os demais. Passava-me em sua fala a autoconfiança excessiva, a arrogância dos jovens demais, daqueles que ainda tem 19 e acham que alguns anos de experiência podem ser substituídos com as teorias provenientes de livros escondidos pela poeira de bibliotecas municipais.
A mim e aos outros tratava com indiferença e constante ironia, causando nos mais irritadiços profunda aversão.
Talvez fosse só seu teste, sua maneira de evitar a contaminação de seu puro espírito pelas palhaçadas do circo popular, o casulo que o protegia dos bips que os altifalantes dos robôs produziam em intervalos regulares, das baboseiras dos lunáticos egoístas, mas mesmo que de certa forma até concordasse em sua proteção, ainda me parecia a maneira errada.
E aos poucos eu, que fora crescido em meio a desafios que todos até hoje desconhecem, que aprendera a ver o espírito separado do corpo, pude ver que brilhava nos olhos daquele jovem outra luz, a luz dos que tem mais que apenas fome física, daqueles que tem uma infinita fome dentro da cabeça, que querem devorar o mundo, o universo, as dimensões e a imensidão além com vorazes mordidas.
E também aos poucos, me senti conquistando a amizade do que por muitas vezes se dizia não meu amigo, usando da vasta paciência da qual dotava então para ignorar os estúpidos comentários do estimado imbecil, acreditando naquela minh'alma que me diz quando alguma amizade vale os esforços executados.
E eis que tornamo-nos amigos. Eis que, ao que o tempo passava, ganhei mais um par de braços e pernas para me apoiar e empurrar, uma mente ávida pelos mistérios para incitar a minha própria nos caminhos do desconhecido, o amor de mais uma pessoa a tornar minha vã existência digna de mais um punhado de sorrisos.
Novas portas me foram abertas, novas histórias me foram contadas, novos lugares me foram apresentados, novas dobradiças foram instaladas no topo de minha cabeça para que fosse mais fácil jogar lá um punhado de novas ideias, e um botão foi instalado em minha testa para que se fizesse mais fácil de fazer uma batida de ideias, uma mistura de possibilidades.
Mas acho que, uma das coisas mais importantes, foi que novos amigos me foram apresentados, pessoas de ideias similares e diferentes, possuidores de outros ingredientes para as misturanças que agora se faziam possíveis dentro de minha mais aberta mente.
Mas há outras coisas importantes, há sim.
É graças a este peculiar indivíduo que hoje escrevo este texto, que hoje mostro aqui, e que não tenho medo de expressar com minhas palavras e ideias a gratidão que por suas atitudes sinto. É graças a ele que muitas coisas novas se fizeram possíveis.
Nos bancos de praças agora há mais filosofia, nas fachadas de prédios há significados subliminares, copos são erguidos em mesas de bar honrando tradições milenares, interrogatórios avaliam fatores aleatórios, as conversas sem sentido vibram pelos ares, e o que mais faz sentido é muitas vezes ignorado em favor das toalhas que você deveria ter aí do lado.
Conheci Roland, Hans-Thomas, Peixoto, Sofia, Adolfo, Jake, Susannah, Eddie, entre tantos outros.
E o tempo passou tão rápido, as algumas memórias se fizeram tão vagas.
Hoje já não é mais tão comum a sua companhia, mas se o encontrar ao acaso, na rua, conversaremos como se ainda fossemos os mesmos colegas separados pelas jaulinhas, e talvez até tomemos um achocolatado e quem sabe até umas bolachas recheadas em qualquer praça por aí. Faremos as mesmas piadas cretinas e riremos, mas não muito, de nossas faltas de sorte.
É ele o idiota que vai achar um bom punhado de erros aqui.
É ele mais um integrante do exército dos que me acompanham a navegar, dos que sentam ao lado, pegam o outro remo e me ajudam a seguir.
De uma coisa, porém, ainda me recordo acima das demais.
Diante das adversidades que lhe eram impostas, sua solução era sempre a mesma.
Amor é a resposta, dizia ele.
Amor é a resposta, repito eu até o fim.

2 comentários:

  1. É, achei erros... eu tinha 20 quando tu me conheceu.

    ResponderExcluir
  2. Fico feliz de ter te ajudado a expandir as Fronteiras Flutuantes, caro amigo.
    Também te amo.

    ResponderExcluir