"Preciso muito do
banheiro", pensou Arlindo na volta da padaria. Neste dia, trazia
consigo umas roscas, uma grande quantia de pão e uma imensa fome.
Ouviu a si mesmo
dizendo isto e olhou em volta, a fim de certificar-se de que ninguém
mais o tivesse ouvido. Atravessou a ladeira em frente a praça cujo
chafariz estava desligado há dias, e fez isso olhando apenas para um
lado. Compras na mão, caminhou pela calçada, pátio e varanda até
a porta de sua casa. Tirou a chave do bolso da calça jeans preta e
velha, abriu a porta, tomando cuidado para derrubar nada, e fechou
sua passagem com uma bundada.
Levou as sacolas até
a mesa da cozinha e as deixou lá, sem abri-las. Foi até o banheiro,
lavou o rosto, as mãos, os olhos; secou as mãos e o rosto;
masturbou-se formalmente, deixando a porra cair no vaso e deu
descarga. Lavou novamente as mãos, agora com mais dedicação. Ligou
o rádio da sala, que seguiu a reprodução de um disco da Joan Baez.
Foi até a cozinha,
serviu a si um copo de leite e levou o pacote de roscas fritas de
polvilho até o sofá. Comeu uma delas e gostou muito. Tomou um gole
do leite e juntou o jornal, abrindo-o na página dos esportes. Não
era isso que queria. Também o obituário não lhe reportava qualquer
vingança. Seguiu, passando sem rir pelos quadrinhos, até a parte
que anunciava as novidades no teatro, cinema, e outros lugares aos
quais não iria. Bastante coisa boa, percebeu.
Comeu outra
rosquinha, enquanto olhava o relógio de parede. Quase seis horas.
Desligou o rádio,
ligou a televisão, devolveu o jornal a algum canto. Assitiu um
seriado estúpido de grande sucesso, comendo as outras três roscas
enquanto encarava a tela, calado, coçando o saco de vez em quando;
saracoteando entre os canais durante os intervalos comeciais.
Continuou calado pelo
resto da noite; depois de tomar seu leite e comer dois sanduíches,
depois de tomar um banho quente. Continuou calado enquanto assistia o
gol marcado pelo Paulo Polícia, enquanto via uma reportagem sobre a
fome lá longe, e até mesmo quando o sinal da tevê sumiu por um
tempo.
Estava calmo, como
costumava estar ultimamente. Calmamente vestiu-se para ir trabalhar,
quando chegou a hora certa. Partiria em boa forma e sem atrasos, como
de costume.
Tudo corria bem, até
que nada aconteceu.
Bah... Saudades do Paulo Polícia...Grande boleiro!
ResponderExcluirBons tempos em que o futebol era praticado por quem tinha amor à bola!
Excluir