terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Epitáfio

Fui jovem.
Estou velho.
Minha perna direita treme. Uma vez era pelo chão frio da calçada. Hoje é por nada.
Longe se foram os dias de festa do mutirão. Os dias das empreitadas, empadas, mandiocadas. Até galinhada.
Mas não reclamo porque lembro do Antônio. Pobre infeliz morreu sem por quês, não morreu de velho. Morreu de velha. A velha mania das pessoas fazerem as coisas sem motivo, sem saber.
Isso já faz tempo.
Tempo faz também em que minha mãe morreu apedrejada, também na calçada. Mas que marmelada.
Uma tragédia na verdade. Mas ela não era muito bonita, nem tinha maneiras refinadas. Era como eu, comia com as mãos. Se coçava com os pés. Tinha cheiro de chuva e por isso pouco importava.
Ao passo que passa, já não mais passo aí. Me faltam as forças. Já se foram os dias de guri.
Vou pra dentro da minha casa, ali debaixo do pé de manga. O antigo local onde encontrava meus camaradas. Gritávamos para as máquinas a passar. Máquinas de passeio.
A minha casa fica na rua, porque das ruas eu sempre serei.
Dimes meu nome.
Um último gemido suspirado.
Uma prova de que não há nada de errado.
Em celebrar uma vida simples.

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