sexta-feira, 4 de março de 2016

Muito Obrigado

Muito, muito. Muito obrigado. Pura obrigação. Por obrigação, não por vontade própria: levantou o rabo da cama, trocou pela farda o pijama, levou consigo o guarda-pó, dependurado ao lado do guarda-roupa; tomou café, limpou o bigode no guarda-napo, saiu de casa sob chuva, sob um guarda-chuva; trancou bem a porta-de-casa, abriu a porta-do-carro, guardou o guarda-chuva no banco-de-trás para não precisar abrir o porta-malas, guardou o óculos de sol no porta-luva, vai que o tempo muda; Ligou o carro, presente divino, e partiu para o trabalho, mesmo sem querer muito, mas com uma sensação de gratidão, por tudo que tinha conquistado; não sem ajuda, sim, era grato, diria "muito obrigado", mas a quem? Adeus. Não há. Disse: há deus? para a mulher, antes de sair, alguma vez? Melhor não criar intriga. Melhor agradecer pelas graças alcançadas, nenhuma de graça, tudo à custa de muito suor, menos no inverno, mas ainda assim algum. Tocou o carro esquina adentro, rua afora, rumo ao fluxo interminável de veículos gratos, nunca grátis, que levariam centenas e milhares de outros obrigados aonde queriam ir sem desejar. Dirigindo com pressa, debaixo de chuva, despencou de cima para baixo de um viaduto, destruindo fatalmente o carro que era dirigido por ele, mas guiado por ninguém mais.

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