“A preguiça tá
grande”, disse o cachorro, ali na calçada, através de gestos,
claro, pois cachorro não fala. Sei, há quem diria que fala, sim,
que ouvem, respondem, entendem, sim, conversam: a pessoa e o
cachorro. Ora, dão até nome e ainda acham que ele aceita, atende,
gosta.
Aquele cachorro na
frente do portão da vizinha estava gostando, ar meio frio, sol meio
quente, espreguiçar; olhávamo-nos,
ele e eu, eu com preguiça não de caminhar, mas de chegar onde ia.
Perguntou:
- Que
tal se eu morar por aqui?
- Por
mim não tem problema, só não vai cagar aí na grama.
- Por
quê não?
- Ah,
sei lá, não é legal, daqui a pouco o cara pisa em cima, fica
fedendo.
- Tua
merda não fede?
- É,
fede, mas...
- E
o que tu faz com ela?
- Ahn,
eu...
- Joga
no rio, né?
- É.
- Pelo
menos aqui na grama tu tem a escolha de ver e não pisar, saca.
- Bom...
é... mas caga aí na do vizinho, então, faz favor.
Não,
não, cachorro não fala, não pode falar, nem fazer favores. Favor,
fervor, coisas de gente. É, cachorro não reza, não precisa de céu,
ele tem aquela calçada, aquela grama, o sol sob o qual se
espreguiçar, agradecer por que, fez porque quis.
Seria
ele parente do Pata, ou do Dimes? Parecia tão ruabundo quanto se
ouve falar deles. Tão distantes, não tem como saber, ou a
cachorrada é toda a mesma, filhos da rua, uma história esperando na
calçada para um dia ser contada, não latiu, nem falou, palavras são
dispensáveis quando se é um cão, um olhar, o olhar certo basta.
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