Lembrou-se de quando era uma criança. De tudo que viveu até ali. Ou do que conseguia lembrar.
Muita coisa perdida, depois recuperada e depois perdida novamente. Como se tudo o que tivesse feito fosse pelos outros e nunca por si mesma. E agora restava o vazio.
Era preciso lembrar também das palavras afiadas daquele cara na internet. A vida não precisa ser miserável. Era o que ele dizia. Ele e alguns outros poucos que, assim como ela, precisavam de um lembrete constante para sarar todas as feridas de uma sociedade doente em demasia.
Quando ela vagava por entre todos esses pensamentos, se deu conta que seus amigos não falavam com ela fazia uns minutos, estavam olhando o Faustão e suas canastrices. Vou embora, por fim disse.
Mais um dia que se vai. Um entardecer. Júlia vai ao seu lar, lar novamente. Escondido entre quatro paredes. Gosto de estar aqui quando posso, pensou. Mas isso já havia sido dito ou pensado. Não adiantava andar num caminho pisado por outrem. Nem mesmo descalço. No entanto, só se lembrou disso quando seu pé descalço pisou na laje fria próxima ao chuveiro, que logo transbordou de água quente.
Não se lava a alma com água e sabonete.
Era uma lógica perigosa, na qual estava entrando. Voltando. Não tem como entrar de novo onde já esteve mais de uma vez, não ela. Precisava da ardência do lembrete. Abriu os olhos ainda com o xampu. Era a mesma ardência, a que dói e que limpa.
Era o lembrete que quebraria a lógica, novamente, como tantas vezes já havia feito.
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