Não por
coincidência, Peixoto deu a Adolfo seu próprio nome. Seria
divertido: pintar um pintor com seu nome, um velhote como ele sabia
que um dia seria. Quem sabe uma espiada no futuro, uma brincadeira
com o que havia por vir, coisa de artista.
Pensou que, se continuasse pintando
até alcançar a idade do Adolfo do quadro, precisaria de umas
paredes bem enormes e o velho chalé não serviria mais; pelo menos
não sem alguma reforma.
Tentou fugir do excesso de pretensões,
pintou Adolfo como sentia que deveria e pronto. Era um pintor,
portanto pintava. Não por acaso, gostou do resultado. Pendurou o
quadro no quartinho onde ninguém dormia, contente, e saiu. No final
de semana foi a um festival de rock and roll; divertiu-se. Ficou
alguns dias sem pintar e na terça-feira seguinte, pela manhã, bem
cedinho, resolveu dar mais uma olhada nas suas obras. A primeira
delas era a mais antiga, já fazia dois anos que a pintara; o
primeiro quadro do qual havia realmente gostado, o seu preferido; uma
moça bonita que parecia não olha-lo diretamente, como se estivesse
preocupada em não se distrair com alguma coisa. Tentou acompanhar o
olhar dela, ver o que ela via, sabia que daria em nada e viu, do
outro lado do quarto, Adolfo segurando o pincel, mirando Sofia. Olhou
de um para outro, deu um passo atrás, e soube que não havia sido
uma coincidência. Enciumado, saiu dali e foi até a padaria. Na
volta, passou no mercadinho da esquina e comprou uma garrafa de
conhaque barato, onde, até onde sabia, um dia se afogaria.
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