quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Corante

Eu já sabia dos riscos. Diferente dos outros talvez, já sabia conscientemente.
Então eu não entrei naquele lugar atrás de segurança ou conforto. Pra mim, estava escancarado em toda parte e só não via quem não queria.
Chamei o atendente e pedi por sinceridade. O que significa que estava dando a ele passe livre para descer do palco fajuto que todos os estabelecimentos possuem e me dizer a verdade, ou o que ele achava que fosse, sem que para isso eu pudesse ter razões para reclamar com o gerente ou não mais voltar ali. Uma prerrogativa pra parar de fingir que está tudo certo em uma tentativa de tentar me tranquilizar para que eu não pense muito a respeito. É. Acho que é isso que significa.
Não era por motivos de saúde, nem por motivos de protesto, era apenas uma curiosidade.
Me olhou de alto a baixo com um sorriso amarelo e disse que nunca havia ouvido falar sobre isso. Tá. E meu nome é Júlia, nascida no dia de ontem também. Como se eu fosse uma idiota. Como se ninguém soubesse.
Acho que a cara que fiz foi de um desprezo intenso. O rosto dele ficou corado e o sorriso adquiriu um tom amarelo-avergonhado. Não era por mal, nem sempre consigo controlar meu rosto, também pouco me importa.
Voltei pra mesa e dei sequencia ao meu almoço. Olhei novamente aquele pedaço de salmão exibindo seu laranja vívido. Continuei me perguntando se aquilo era um peixe criado em algum outro país com mão de obra barata e tratado a ração com corante, coisa que o atendente "nunca ouviu falar".
Pus na boca com o garfo, mastiguei e engoli.

Provavelmente era corante. E o gosto era tão bom quanto era inútil tentar descobrir coisa alguma.

Um comentário: